A Feira do Pirangi e as histórias de quem a faz
- Tópicos Esp.em Jornalismo
- 23 de out. de 2018
- 5 min de leitura
Atualizado: 27 de nov. de 2018
Por: Ana Laura Freire, Anathalia Maia e Gabriela Severiano

Sons, sabores, aromas e odores: dá para resumir a manhã do domingo na Feira do Pirangi nessas palavras. Há mais de vinte anos, essa é a rotina de muitos feirantes que ali trabalham. Alguns estão desde o início, há vinte anos, quando ela ainda acontecia em outro lugar do bairro. Outros, chegaram há poucos anos, como é o caso de Benedita Moura.
A barraca de Benedita chama atenção entre as demais. A maioria vende os artigos mais comuns das feiras de bairro: frutas, verduras, e carnes em geral. No meio daquele barulho, Benedita está com suas plantas. Sim, Ela tem uma barraca com plantas ornamentais; de samambaias até bonsais.
Natural de Caraúbas, Benedita Moura, 29, veio para Natal há treze anos. Trabalhar na feira não era seu objetivo como fonte de renda, mas com o tempo, gostou tanto do ofício, que fez dele seu sustento. Ela se diz apaixonada pelas plantas, e, mantém contato com a maioria dos seus clientes. No meio da conversa, ouvimos uma voz: ‘’Que planta é essa aqui?’’, pergunta um novo cliente. Sem deixar de nos dar atenção, Benedita responde prontamente e com um sorriso no rosto: "é uma bromélia!’’
Perguntamos sobre a moradora da região que se incomoda com a estrutura da feira naquele lugar, e que quer a saída dos feirantes dali. Ela responde que não sabe sobre isso: ‘’Não sei dessa história, não. Não ouvi falar.’’ Mudamos de assunto, e ela faz questão de dizer o nome todas as espécies que estão em sua barraca, explicando a ‘finalidade’ de cada.
Benedita nos conta que ser feirante não foi uma opção para ela, mas que hoje se sente satisfeita por poder trabalhar com o que mais gosta. Ela comenta sobre a liberdade que trabalhar na feira e que se sente satisfeita com o que faz. “É bem mais livre, não tenho que receber ordem de ninguém, os clientes são amorosos, sempre.” ela afirma.
Sem conter a empolgação, ela nos conta que mantém contato com todos os clientes que comprar plantas a ela nos domingos. Possuem contato por redes sociais e aplicativos de mensagem no qual o cliente lhe envia fotos das plantas que estão se desenvolvendo e que costuma ajudá-los com dicas sobre como cuidar melhor das plantas.
No entanto, é notável que sua maior alegria é trabalhar com as plantas que são sua paixão e pela relação de amizade que estabeleceu com aqueles que passam por sua banca todos os domingos.

As histórias que se cruzam: o lugar, a feira e a feirante
Neópolis não é um bairro tão antigo, mas já tem uma certa história. Surgiu na década de 70, na zona sul de Natal e faz fronteira com Parnamirim. Era pequeno e foi se expandindo aos poucos, o Conjunto Pirangi é apenas um dos que fazem parte dele, tendo também o Jiqui, Serrambi, entre outros.
A Feira do Pirangi existe desde a década de oitenta e nasceu praticamente junto com o conjunto que surgiu na mesma época. Ninguém soube nos dizer precisamente quando, mas todos afirmam que já existe há mais de vinte anos. No entanto, ocorre todos os domingos, religiosamente. De acordo com o site da Secretaria de Serviços Urbanos (SEMSUR), possui 41 feirantes e 86 bancas.
Sendo assim, nem todos são tão jovens como Benedita por ali, alguns dos feirantes estão há mais tempo entre as bancas, e suas histórias praticamente se misturam a da Feira do Pirangi; uma faz parte da outra, e depois de alguns anos, é quase difícil se desassociar.
Alguém como Edilene da Silva, feirante por quase uma vida inteira e que pode dizer que já viu as passagens da feira por diversos lugares do bairro. Isso porque dos vinte anos em que a feira já existe, ela já está ali há quinze anos com sua barraca e tirando o sustento de sua família. “Ela já foi ao lado da igreja, em frente a igreja e agora mudou para cá’’ diz ela.” Ela conta, enquanto arruma um jeito para nos responder e seguir o trabalho ao lado da irmã que a ajuda naquele domingo.
A barraca de Edilene mostra-se como uma das mais variadas, com queijos, manteiga de garrafa, carnes e bolachas expondo-se nas duas barracas das quais toma conta com a ajuda de sua irmã. Mãe de um filho de 26 anos, ela conta que vez ou outra traz seu filho para ajudá-la, quando sua irmã não pode vir, ou em sua palavras ‘’se vira sozinha’’, quando mais ninguém pode acompanhá-la.
"Todo meu sustento de estudo, de casa, de tudo foi tirado daqui". Ela afirma, convicta, mesmo que a decisão de ser feirante tenha sido mais uma necessidade do que uma escolha. Para isso, ela chega cedo todos os domingos, às 4h30 da manhã e fica até o fim, às 13h quando a feira termina deixando para trás mais um longo e mesmo assim satisfatório dia de trabalho.

Em família
Catarine Oliveira trabalha na feira há dois anos, devido a ausência de emprego fixo foi levada pela tia que junto ao marido já trabalham em feiras há 20 anos. Trabalhando em uma banca vendendo tapioca com a tia, ela diz que a necessidade a levou para o trabalho.
“É algo mais para a necessidade. E também para você não ficar em casa”. Sua tia também vende frutas, tendo expandido nos últimos anos para as tapiocas; seu tio e sua prima ainda trabalham com a parte de frutas, contando com apoio de três ajudantes. Ela sorri quando fala do filho, mas não entra em muitos detalhes, não fala de nome, idade.
“Da minha parte, de algumas coisas, sim”, responde quando perguntada se o dinheiro da feira provê o sustento da casa. “Não, porque meu esposo trabalha, informal, mas trabalha.” corrige ela na mesma frase. Sua família também trabalha em outras feiras, São Miguel na segunda e Touros na terça, mas ela não os acompanha nesses dias.
Eles chegam às 4h30 e ela sai junto à família e aos ajudantes de 12h30, mas a feira termina antes disso, “É uma feira que termina cedo”, Catarine reconhece com um certo alívio.
A Feira resiste através do tempo
Mesmo sendo algo tão antigo no bairro e que já faz parte de sua história, A Feira do Pirangi sempre encontrou quem fosse contra sua existência, o que causou sua passagem por diversos lugares do bairro e sempre esbarrando em quem fosse contra sua existência.
O motivo alegado pela população sempre é o mesmo: a sujeira que é deixada pela feira após seu fim todos os domingos, algo que poderia ser resolvido pelo poder público de uma forma mais eficaz.
Como nos disse Edilene, a feira já foi em diversos lugares até chegar a Avenida São Miguel dos Caribés onde acontece nos dias de hoje, todos os domingos. No entanto, também já encontra resistência no local atual onde a feira se encontra.“Tem uma moradora aqui da rua em frente que está criando o maior problema, disse que ficam muita sujeira e que está querendo acabar com essa feira.” informa a feirante, preocupada.
Ela enfatiza que apenas essa pessoa demonstra vontade de que a feira saia daquele local, mas ainda assim, parece temerosa pela situação que ficaria a vida das diversas famílias que dependem a feira para seu sustento. “É uma coisa que vai tirar muitos pais de família do seu trabalho, o emprego que é nosso. (...) A gente está indignado com isso.”
Apesar disso, ela tem esperança que apenas a ação de uma moradora consiga acabar a feira que existe desde a década de 80 e que já faz parte da história do bairro. Edilene diz que o processo corre na prefeitura e que acredita que juntos conseguirão manter a Feira do Pirangi viva e resistindo por mais tempo. “São tantos contra uma não é? Não é possível que ela vá vencer a gente”, afirma.
Comments