Feira de Nova Natal: faz gosto a gente ver
- Tópicos Esp.em Jornalismo
- 23 de out. de 2018
- 4 min de leitura
Atualizado: 6 de nov. de 2018
por Clécida Fernandes e Jefferson Rodrigues
Antes que o sol do dia anterior se ponha, um lado da “Chegança” já está interditado com bancas de madeira por toda a extensão e a Rua do Pastoril em toda a sua extensão quase já não permite passar um transeunte interditada de bicicleta.
A atividade é intensa e se não falta trabalho, com algum sacrifício, em meio a madeira, batidas, toldos e lonas é possível ver trabalhadores informais de feições muito jovens, na preparação do grande mercado a céu aberto que será transformado o lugar.
No leva e traz de paus, ainda, é escasso ver braços femininos na labuta. Como que havendo um contrato, a elas está reservada a função de encher de luz a avenida quando os primeiros raios de sol, cortam o escuro da madrugada do domingo.
Fotos: Clécida Fernandes
Nem é preciso as primeiras horas do domingo, a movimentação intensa dura parte da tarde do sábado e madrugada do domingo. Ali o espaço é concorrido entre um e outro cão abandonado, alguns “pingunceiros”, como são chamados os moradores que perderam seus lares para o para casas de comércio e, por algum resquício de saudade se mantêm nas calçadas, vendo as horas passarem; além dos jovens que, sem notar passam a integrar o espaço num vai e vem que pouco lhes permite olhar o espaço que transformam e enchem de toldos, até o primeiro cantar dos galos, barracas dos mais diversos produtos.
“A feira é como uma terapia,a gente conversa com as pessoas: um chega fala, outro chega brinca”, confidenciava Vitória de 40 anos, quando ouve-se encostando-se à companheira, a voz de Neto - 53 anos, um “cabôco" desses fornido que não aparenta ter a idade que tem e completa: “feira é a mesma coisa que “usar droga”, a pessoa se “avicia”. O senhor de riso fácil e fala espontânea toma o espaço e a conversa da colega e conta que nos últimos 15 anos de feira já quebrou bem (3) três vezes e acrescenta: “sofrendo já criei (4) filhos na feira”; numa linguagem simples, o modo mais fácil de explicar que da feira tirou o sustento de seus filhos.
Duas ruas, inúmeras vias e vidas: o fim
Ir a uma feira como a de Nova Natal com um roteiro pré-estabelecido é ter a certeza de que se vai perdê-lo em qualquer esquina ou pela extensão de uma das “ruelas” entre uma barraca e outra em que ela se esparrama em cores, gritos, músicas, perfumes, formas e sabores, que a salivação da língua denuncia. Dessa fase para a frente perde-se o contato com o real, ali passa a ser um mundo todo particular em que vidas e histórias se emaranham nas vielas estreitas, assoberbadas de gente comprando. Foi assim que perdeu-se de registrar em vídeo, o dispositivo móvel descarregara, a história de Gorete, a pessoa em que primeiro se pensou para a reportagem foi tão somente a última. Muitas foram as riquezas encontradas, o papo ligeiros e as conversas demoradas. Uns falavam espontaneamente, mas não queriam ser registrados, outros falavam longos minutos e não havia como se desprender daquele “feitiço”.
Gorete é uma feirante simpática de 62 anos, de sorriso fácil que já tem mais 35 anos de feira. Só no mesmo ponto da feira em Nova Natal, já se vai trinta anos. Ela nos segreda que ainda jovem fazia feira em São Paulo, lugar em que viveu parte de sua juventude, quando decidiu voltar para Natal, seu lugar de nascimento. O gosto pela feira lhe pegou por lá onde negociava com frutas. Chegando aqui passou a lidar com: grãos variados de feijões, arroz; amendoim; farinha de mandioca e de gergelim; além de rapaduras de tamanho e sabores variados: preta, com castanha, de cana, batida. Também nos fala do cansaço e dos perigos e que pensam em parar, talvez coloquem um ponto de venda só em casa.

Diante do vão, consideravelmente, grande daquela tenda, se observa o casal cada um numa ponta, mas logo é fácil perceber a sintonia e cumplicidade que existe naquele silêncio e distância; num olhar eles se comunicam. É impossível passar pela barraca e não ser fisgado, senão pela conversa, mas pela beleza do espaço.
A feirante nos conta que anda ficando cansada e que reza para que a aposentadoria sua e de seu marido saiam, para que possam descansar. “Fazemos essa feira e a do Santa Catarina/Soledade, mas durante toda a semana ele, fala enquanto aponta o marido com o dedo, trabalha fazendo a escolha e arrumando as sementes." Temendo que a conversa se alongasse, nos pede licença para atender uns clientes e nos despedimos.
Duas ruas, inúmeras vias e vidas: O começo
No plano estava a ideia de chegar cedinho, mas os atropelos nos fizeram adentrar no meio da muvuca. No domingo da feira, a "Chegança" vira um emaranhado de gente, carros, motos, bicicletas, transeuntes, galinhas, cordas de caranguejos, peixes, frangos, carne assada, pinga, frutas, verduras e utensílios que você nem imagina que existem e, embora saiba que não precisará, será tentado a comprar. No meio dessa confusão encontramos um jovem carregando uma estrutura de madeira que lembrava o esqueleto de uma geladeira cheiinho de abacaxis. Pedimos para conversar, ele topou e lhe demos as alternativas. ele aceitou ser gravada sua voz, sem a imagem. Topamos!
Sobre a Feira
A feira conta com cerca de 283 feirantes e 550 bancas. Funciona aos domingos, das 5 às 14 horas e fica localizada na Avenida da Chegança com a Rua do Pastoril, no Conjunto Nova Natal - Bairro Lagoa Azul - Zona Norte de Natal/RN.
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